Aprendi com meu novo e velho e morto pai a gostar dos judeus – gente honesta, que tem palavra e a cumpre até o fim – e a gostar de Israel, terra dos judeus.
Idem dos “turcos”, que tanto marcaram minha existência com seu humor e apego.
No vetusto Colégio Estadual do Paraná estudei com filhos dos filhos dos campos de concentração, ou não. Idem no coral da escola.
Com a turcada, idem.
Nunca vi diferença entre o meu grande amigo, um dos melhores da minha vida, Paulo Mehler (judeu, hoje empresário) e o meu grande amigo Riad Bark (irmão de Selem, Hahmed, Buzaid, Touffic, Salma, Amira e Amine, empresário de la noche e de las canciones), um dos melhores da minha vida. Ou meu grande amigo Luis Milman, meio distante (judeu) e João Pedro Botros Amade, meu primeiro amigo, hoje no Líbano (mais distante ainda, espero que ainda vivo).
Corte.
Em 1989, meio a trabalho, meio a prêmio da Agência Estado, fui-me para Israel a pretexto de cobrir uma Macabíada, uma espécie de olimpíada entre países, na qual só concorrem delegações de origem judaica. Jornalisticamente, coisa fraca: de tops só havia um quarto colocado olímpico em arremesso de alguma coisa (EUA) e um vice-campeão mundial de karatê, que nem é esporte olímpico ainda (Austrália). Os tops judeus do mundo nem deram bola.
Mas conheci o país graças a essa viagem, com companheiros bacanas, principalmente Fernando Paulino (até o Milton Neves estava nessa), sempre escudado pelo amigo Ricardo Setyon, judeu paulista que vivia em Jerusalem.
Belo país. Fui de rabo a cabo. Rezei na mesquita, bati cabeça no Muro (onde deixei bilhete cujo conteúdo jamais revelarei), dirigi carro em Tel-Aviv, mergulhei (se é que é possível) no Mar Morto, passei por Qumram, subi Massada de elevador e desci a pé.
O israelense é simpático, curioso. Há imigrantes de várias partes do planeta e milhares lá nascidos (baixinhos, fortes, meio desconfiados).
As mulheres - sabras, de sabra, um fruto espinhoso e deliciosamente doce por dentro - são invariavelmente belas, baixinhas, corpos bem desenhados, sorriso meio tímido.
Na praia, em Tel-Aviv, as que servem ao Exército desfilam de bermudas (pernas, pernas judaicas) com metrancas poderosas penduradas no ombro.
Quando fui e voltei do Egito, fui submetido ao interrogatório de praxe, até olhar o crachá da baixinha alourada e ver que era brasileira. Gaúcha. Mas, bah, tchê. Tenho cara de palestino, demorou um pouco até ela confiar em mim.
Não, não escreverei minhas memórias israelenses aqui.
Entendo Israel (assista a Munique, de Steven Spielberg). Mas não compreendo Israel (assista a Munique, de Steven Spielberg).
É cercado de inimigos, sim.
Desde os idos de 1938 (antes da II Guerra, portanto), quando a turma começou a reocupar territórios. Também foram terroristas (na definição do que é ser terrorista, que vem de tempos idos) os que explodiram um hotel em Jerusalem lotado de ingleses. Menahem Beguin participou.
Em 1948 foi criado, instituído, o estado de Israel. O da Palestina não podia ocupar o mesmo lugar naquele espaço (estou sendo simplista e ignorante) e seus representantes resolveram blefar. E perderam.
E tem mais: Jerusalem, capital de quem?
Israel sempre foi atacado, como inimigo que é. Israel sempre se defendeu e atacou, como seus vizinhos são seus inimigos.
Não tem vizinho como a gente: me empresta o sal?, quer ouvir o último do Chico?, quer um gole de caipira?, baixa o som, por favor?
Vi, nos territórios ocupados, miséria e ódio.
Vi, do outro lado, justificativas para ocupar territórios. Autodefesa. Não é fácil mandar a filha a uma lanchonete e ela explodir com tudo.
Mas também tem o espaço vital, e mais: água, água.
Estou sendo simplista, repito. Não batam em mim.
Entendi tudo e não entendi nada.
É justo defender-se, óbvio. Mas nunca oprimir, reprimir, massacrar.
Há milhares de anos de história e de crenças e de fé e de sentimentos por trás e acima de tudo.
No fundo da minha ignorância da história, da sociologia, da antropologia, da religião, juro que só queria que os brimos se entendessem.
Não, não torço, mas não sou neutro.
Sempre fui David. E aqui sei quem é Golias.
Podiam ser dois Davids.
Eu os tento entender, embora não os compreenda, e admita, ora copiando (em outro contexto) trecho do poema de Félix de Athayde: “Por trás dos óculos, por trás dos séculos, confesso, sou um brasileiro perplexo.”
Deixem navegar os barcos, deixem atracar os abraços, os olhos que veem, os alimentos do corpo e da alma.
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